sexta-feira, 27 de março de 2015

A importância dos contos infantis

                                                                   Era uma vez…

Para a criança o mundo nasce da sua interação com o mesmo. Ou seja, o mundo é visto através da sua envolvência. Numa fase inicial, o mundo da criança gira apenas em torno da sua mãe, e posteriormente vão surgindo todos os outros elementos.
O mundo simbólico, ou seja, a capacidade de compreender o mundo através de elementos representativos, surge aproximadamente entre os dois e os três anos, altura em que a criança começa a “construir” brincadeiras. Anteriormente, as pessoas e objectos apenas existiam quando a criança estava em contacto com as mesmas, apenas quando as ouvia, cheirava, saboreava ou tocava. Com esta aquisição, nasce também o mundo da fantasia, a capacidade de imaginar e de experienciar situações, sem que esteja em contacto directo com as mesmas.
É também através deste mundo imaginário que a criança vai criando, que ela vai elaborando as suas necessidades conscientes e inconscientes. Desta forma, tornam-se tão importantes os espaços lúdicos, espaços onde a criança possa representar o seu mundo. E é também nesta representação que a mesma o vai conhecendo.
Nesta altura, destacam-se de grande relevância os contos infantis, sendo que a criança adquire uma melhor compreensão do mundo através da fantasia. Através das histórias a criança tem a possibilidade de se identificar com os personagens e também com os problemas das mesmas, sem estar próxima deles, de forma inconsciente. As histórias permitem que a criança tenha contacto com situações, que de uma forma indireta, são em tudo semelhantes às do quotidiano. E é nesta experiência, em que surgem os lobos maus, as bruxas, os meninos que se perdem dos pais, que a criança tem contacto com angústias do seu dia-a-dia, tendo a possibilidade, nas histórias, de se sentir tranquila ao contactar com os finais felizes. Afinal, todas as crianças têm contacto com situações que as assustam, que lhes metem medo. Neste contacto indireto, poderá surgir a possibilidade de a criança se identificar com personagens com 'personalidades' diferentes da sua e também situações angustiantes que se possam assemelhar a situações que lhe sejam próximas, com a vantagem de que nos contos há um final feliz.
Este final feliz não surge como a imagem de que tudo corre sempre bem, mas antes com o objectivo de transmitir alguma tranquilidade, por exemplo: na historia do Hansel e Gretel, os irmãos perdem-se na floresta, o que pode remeter para a situação da criança que se está a tornar autónoma e independente e tem medo de ficar só, abandonada. No fim estes encontram o pai, que os abraça, e este final feliz surge com uma mensagem de segurança, como se os pais estivessem sempre lá. Para a criança, é de extrema importância sentir que tem uma base, um apoio forte e seguro dentro dela, que lhe permite avançar para explorar o mundo. E é neste sentido que surgem os finais felizes.
Simultaneamente, os contos infantis dão tranquilidade à criança que imagina sobre eles. Os contos infantis são também uma forma de permitir que a criança sonhe, e por isso podem ser utilizados como forma de tranquilizar a criança antes de dormir.

Margarida Garcia
Psicóloga Clínica
Cédula profissional n°11533
E-mail:margarida.oliveira.garcia@gmail.com

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MITOS SOBRE A IDA AO PSICÓLOGO

A procura de apoio psicológico consiste, por vezes, num pedido de ajuda. A este pedido é geralmente dada toda a importância. Entende-se, que não são raras as vezes, em que este aparece como um grito de socorro e num contexto de vergonha e de medo. Este pedido de ajuda ocorre quando alguém não se sente bem, tem dificuldades em entender-se a si mesmo e isso causa-lhe transtorno. Todos nós, em algum momento da nossa vida, nos questionámos sobre o porquê de termos feito aquilo ou sentido daquela maneira. Mas por vezes esta dúvida persiste e parece não ter resposta, parece que nos deixa uma angústia com a qual não sabemos lidar.

Ao psicólogo cabe o papel de ouvir, de compreender, e acompanhar o seu paciente na percepcão de si mesmo, nesta transformação e construção. Salienta-se que este acompanhamento não consiste em dar as respostas, em dizer se fez bem ou mal, mas antes em orientar o pensamento da pessoa, ajudá-la a responder-se a si mesma. E aqui surge por vezes a questão se o psicólogo dá respostas. Não!

Na psicologia não se pretende que o terapeuta assuma a responsabilidade dos atos e pensamentos do outro, mas antes que este ajude os seus pacientes a refletirem e autodescobrirem-se. O psicólogo procura que o paciente em terapia se oiça a si mesmo, oiça aquilo que diz e que às vezes parece que não diz, e que desta forma encontre as suas respostas. Fazendo uma comparação: se uma criança em idade escolar perguntar como se lê uma palavra e lhe responderem que é assim, ela apenas saberá a palavra naquele sítio e não a entenderá. Desta forma, se voltar a aparecer a palavra ela não a saberá ler e terá de procurar ajuda novamente, também não reconhecerá as letras e por isso se as vir noutras palavras não terá autonomia para tentar saber, e ainda, caso lhe tenham dado mal a resposta a responsabilidade será de quem lhe disse e não dela.

Segundo Maria Rita Leal "o profissional de psicologia deseja ajudar alguém a encontrar o caminho para promover dentro de si mesmo o seu potencial humano (...) assume o compromisso de acompanhar pessoas na difícil busca de liberdade e de realidades interiores...". Assim, o processo terapêutico consiste num processo de crescimento interno do paciente em psicoterapia. Este é um processo gradual e que para cada pessoa tem o seu ritmo.

Neste processo de crescimento também é necessária uma adaptação, pois a forma como um adulto fala é diferente da forma como a criança comunica. Para a criança nem sempre é fácil traduzir por palavras aquilo que sente e, por isso, o terapeuta recorre também à linguagem da criança: os brinquedos. O psicólogo, através de brinquedos específicos acede ao mundo da criança, comunica com ela ajudando-a a compreender-se a si mesma através de situações que lhe são familiares e as quais ela traz para este contexto.

A ida ao psicólogo, bem como a exposição dos problemas pessoais ao mesmo, não deve ser temida. Por vezes as questões sentidas parecem “ridículas” para o próprio, mas estas podem ser as mesmas de outras pessoas e a ajuda de um técnico especializado é seguramente essencial no desenvolvimento pessoal, ao nível do auto-conceito e do bem-estar.


Margarida Garcia
Psicóloga clínica

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terça-feira, 24 de março de 2015

Hiperatividade: Diagnóstico ou Sintoma?


“Receio que não haja crianças hiperativas mas adultos com défices de atenção.” Eduardo Sá, Revista Pais & Filhos 

As opiniões dividem-se! Enquanto uns fazem uma abordagem puramente biológica – como é o caso dos Estados Unidos, onde a taxa de incidência de TDAH (Transtorno do Défice de Atenção com Hiperatividade), ronda os 9% da população infantil em idade escolar -, outros adotam uma perspetiva psico-social, compreendendo a questão à luz de problemáticas situacionais – sendo exemplo disso a França, em que os diagnósticos são inferiores a 0,5%.
A hiperatividade por si só não encerra um diagnóstico, mas é antes um sintoma. E pode ser um sintoma de variadíssimas questões:
1.       Simplesmente ser criança: as crianças mexem, pulam, gritam, brincam, correm, cansam quem observa de tanta atividade, mas não se cansam. Não são adultos, são mesmo assim: CRIANÇAS! Saudavelmente, crianças!
Quando, ainda assim, parece ser uma agitação excessiva, a lista pode continuar:
2.       Excesso de atividades: Pode acontecer que a agenda semanal da criança está tão sobrecarregada de atividades, que a própria criança entra num ritmo de agitação provocado por não ter mais momentos de puro lazer e descontração. Por muito atrativas e apreciadas que as atividades sejam, é importante priorizar algumas para que a semana não seja vivida num corrupio de horas de entrada e saída do que quer que seja.
3.       A hiperatividade também surge no registo do chamado “fuga para a frente”, isto é, a criança que não está bem por alguma razão e age muito para não pensar. É o sentir que “não posso parar”. Às vezes até chegam a conseguir relatar que não conseguem parar (o que também dá indícios sobre o mal estar).
Naturalmente que uma criança mais “agida”, terá mais dificuldade em concentrar-se. Especialmente se a agitação estiver relacionada com algum desconforto. Nesse caso terá outros indícios, como não conseguir ver um filme completo (quando pela idade isso é já esperado); mudam rapidamente de brincadeira e de brinquedo, como se se cansassem facilmente do que têm; dormem pouco; parecem compreender as regras, mas habitualmente não as cumprem, etc.
Ponderando o cenário acima descrito, e percebendo que a hiperatividade por ser significado de um mal-estar associado, como será possível a concentração? Utilizando uma expressão popular, se a criança “ está tão preocupada com os seus botões”, e canalizando a sua energia para a ação, como sobrará para estar atenta? Percebe-se, assim, a habitual relação feita entre os dois sintomas: Hiperatividade e Défice de Atenção.
Todos nós sabemos que, ao tomar um analgésico, a razão da dor não desaparece. O que é eliminado é simplesmente o sintoma. Acontece, então, que o problema subsiste, só anulamos o sintoma que dá expressão a esse problema. Exemplo: um analgésico elimina uma dor de cabeça, mas (imaginando que essa é uma dor provocada por falta de visão) não corrige a questão oftálmica – atua somente no sintoma, não na raiz do problema. Precisamente o que se passa com a medicação aplicada à Hiperativade e/ou ao Défice de Atenção.
Atualmente, os diagnósticos de TDAH somam-se e multiplicam-se a uma velocidade preocupante e as crianças, adicionalmente ao rótulo, recebem medicação para anular a agitação e garantir a concentração. Resolve o problema? Não! Quando param a medicação, mantêm o mesmo padrão de comportamento – a medicação age exclusivamente sobre o momento da toma e sobre o comportamento (sintoma). Não age no que origina o comportamento hiperativo e a dificuldade de concentração. Conseguem melhores resultados escolares? Sim! Enquanto tomam o medicamento, os níveis de atenção são aumentados, o que garante maior segurança no sucesso escolar. Isso justifica que se medique sem compreender o que está na base do desenvolvimento de um comportamento menos adequado? Discordo, em absoluto!
Alexandra Silva Nunes
Psicóloga / Psicoterapeuta
Cédula Profissional nº 3347

E-mail: alexandrasilvanunes.psicologia@gmail.com


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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

O segredo das BIRRAS!

Enquanto uns se apressam a rotular a criança de teimosa, e imediatamente surge um familiar próximo com quem a identificam, outros preocupam-se com a forma como podem lidar com a situação – tudo por causa das birras. “Serão normais estas birras?”; “Por que é que acontecem?”; “Como devo reagir?” São questões muito comuns.
As birras são muito comuns na fase dos 2 / 3 anos de idade e são normais e até saudáveis. São comuns a todas as crianças dessa faixa etária (ou espera-se que sejam) e são consideradas saudáveis porque acabam por passar uma aprendizagem à criança, se o adulto / cuidador reagir adequadamente à situação.
Antes de começar a caminhar, a falar e a conseguir o controlo dos esfíncteres, a criança é muito dependente dos cuidadores. É a partir do momento que começa a poder deslocar-se - com a aquisição da marcha; a começar a falar – aquisição da linguagem, e a controlar os esfíncteres que consegue sentir-se mais autónoma; mais independente. Ora a autonomia permite-lhe a possibilidade de opor-se aos outros e dá-lhe uma maior sensação de poder: “posso ir para onde quero; posso dizer “NÃO” e decidir onde e quando saem os meus cócós e xixis”. Esta “força” que sente vai tentar aplicar a todas as circunstâncias em que a vida não lhe corre como mais deseja. E usa o espernear, gritar, pontapear e atiradas para o chão como argumentos de peso.
Como ser intuitivo e muito perspicaz que é (todas as crianças o são), lança os ditos argumentos de peso e aguarda pela reação dos cuidadores para perceber:
1.       Se assentem ao desejo, validando o argumento - que passa de negado, em primeiro plano, a consentido, logo a seguir;
2.       Ou, então, os cuidadores suportam a birra; não a valorizam e esperam calmamente que a criança consiga tranquilizar-se
É nesta reação dos adultos que pode residir a chave para que as birras sejam uma mera fase do desenvolvimento emocional infantil, considerada por si só como transitória, ou assumam contornos de comportamento característico da criança.
Os cuidadores devem, esperar que a criança se tranquilize sem ceder ao que originou a birra, quer este comportamento seja em casa, num ambiente mais privado, quer seja fora, num espaço público. Os desejos concedidos durante uma birra promovem o continuar deste comportamento porque a criança percebe “isto funciona”.
A capacidade dos cuidadores suportarem / aguentarem o momento da birra, proporciona à criança:
1.       a possibilidade de aprender a tolerar a frustração. Efetivamente, nem tudo o que se deseja pode ser alcançado e é desde pequeninos que essa aprendizagem é feita, através destas pequenas frustrações.
2.       A sensação de limites que conduz a criança a sentir-se mais segura, mais apoiada, vivenciando os cuidadores como fontes de suporte.
Espera-se que a atitude dos cuidadores seja consistente no tempo, permitindo à criança espaço para compreender que os pais estão seguros de si, têm regras bem definidas, o que se traduz em conforto e segurança para a criança. Desta forma, conseguirá sentir os pais como os pilares fortes que precisa para crescer saudavelmente confiante.
Muito embora as já referidas birras sejam comuns no processo de desenvolvimento emocional, é importante ter em atenção a idade da criança para poder definir o comportamento como ajustado (ou não). Se persistirem dúvidas, não hesite em contactar-nos.

Alexandra Silva Nunes
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quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

A medida dos avós

A medida dos avós

Nesta geração em que os avós são tanto ou mais cuidadores do que os pais - fazem o percurso de e para a escola, dão banho, vestem, fazem o jantar, ajudam nos TPC e que, muitas das vezes, cuidam também aos fins de semana – assumem um papel no desenvolvimento e educação da criança.
O amor é desmedido, o tempo é largamente superior ao que tinham quando foram pais, e a tolerância tende a ser proporcional a esse tempo. E falando em proporcionalidade, a exigência; as regras; a disciplina, no fundo, também entra num registo de proporção – mas desta vez inversa à quantidade de tempo e de tolerância. Que é como quem diz: amor acrescido, tolerância aumentada, regras diminuídas.
A grande verdade é que os pequenos também precisam de algum espaço de tolerância zero, em que as regras de trânsito da disciplina, funcionam assim como se o polícia sinaleiro estivesse de serviço mas em modo adormecido, aqui e ali… O que depois define entre pequena transgressão e crime maior é, em primeiro lugar: a dose deste espaço (espaço “tolerância zero”, entenda-se).
Se a casa dos avós é como um hotel de 5 estrelas, super luxo – aqueles em que só vamos esporadicamente – a guarda estar em fraca vigilância é bem vinda. Se, pelo contrário, a estadia é de caracter quase permanente, então impõe-se um código de conduta mais claro, daqueles que dão o conforto às crianças de saberem com o que podem contar; para poderem ajustar as expectativas de como serão as reações dos adultos às suas investidas em delitos.
A segunda regra de ouro para que esta “tolerância zero” possa ser saudável (sem qualquer intenção de priorizar a importância de cada uma em relação à outra), é que nunca os avós se imponham aos pais e cometam atentados fatais à autoridade destes últimos, e muito menos! na presença dos pequenos.
Para que o desenvolvimento possa ser equilibrado e saudável, é importante a disciplina e o amor, a autoridade e o mimo, o aconchego e o ralhete. E é tudo isso na medida certa que presta um grande auxílio a um desenvolvimento emocional harmonioso. Então para que haja um espaço positivo à “tolerância zero” é importante que co-habite com uma parentalidade firme, coerente e consistente e que, se alguma dúvida restar em qualquer circunstância, a criança possa ser recordada sobre de quem é a última palavra, sem sentir que isso é matéria ainda não decidida pelo grupo dos adultos.

Alexandra Silva Nunes
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quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Na cama dos pais (ou não…)

Crianças, pais e cama própria é um assunto tantas vezes abordado, mas sempre com questões intermináveis para os pais. Há mesmo quem afirme que os seus filhos não são capazes de dormir / adormecer sozinhos “eu sei que outros conseguem, mas o(a) meu (minha) não dá… já tentei e não funciona.”.

Todas as crianças conseguem adormecer sozinhas! Precisam de treino, de ser ensinadas – uma demoram mais tempo; outras demoram menos, mas todas são capazes. Muitas das vezes a dificuldade está nos pais. É aos pais a quem mais custa deixar os seus filhos sozinhos no quarto até adormecerem ou mesmo a dormir sozinhos. Quer por pensarem que os filhos podem não estar bem, sem companhia; quer por os próprios pais (entenda-se os dois ou só a mãe ou só o pai) não quererem estar sem a companhia da criança.

A questão principal deve centrar-se em “é importante a criança ter o seu próprio quarto / cama para dormir?"; “é importante a criança adormecer sozinha ou posso fazer-lhe companhia até adormecer?”.
As respostas: As crianças devem ter o seu próprio quarto, cama própria e adormecer sozinhas. É importante e saudável que assim seja. Naturalmente que poderão reclamar a presença dos pais; reagir por não quererem estar sozinhas; chorar, chamar… Os pais devem ir, apoiar, mostrar que estão presentes e atentos, mas voltar a sair até que a criança consiga adaptar-se ao seu quarto e ao facto de adormecer sem companhia. Os pais devem “aguentar” este choro / chamamento / reclamação sem cederem a passa-los para a cama dos pais ou a ficarem junto da criança até que esta adormeça.

O “contacto” com os seus medos, com o desconforto que poderá provocar a noite e o estar sozinha, proporciona à criança a possibilidade de poder confrontar-se com isso mesmo, aprendendo a geri-los interiormente e ultrapassá-los. Esta conquista favorece a sua autonomia emocional, o que é de extrema relevância no desenvolvimento emocional infantil. Isto proporciona à criança perceber que é capaz; que consegue transpor barreiras (neste caso as do medo, por exemplo) e a sentir-se segura, sem precisar para tal da presença constante do adulto. Isto é, neste confronto entre os seus receios, o estar sozinha num espaço e perceber que a presença do adulto é uma certeza – ainda que sem contacto visual – a criança cresce de forma mais autónoma e, portanto, necessariamente mais saudável. Este poderá ser entendido como um dos caminhos pelo qual os pais dão aos seus filhos ferramentas para se alicerçarem numa confiança e segurança evolutivas que vem de dentro, ao invés de crescerem a pensar que precisam sempre de um apoio; de uma bengala exterior (os pais, por exemplo), tal como acontecia quando nasceram.
Alexandra Silva Nunes
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Infância 100 limites

No que parece uma tentativa de corrigir o autoritarismo que militava na educação das anteriores gerações, os actuais pais tendem a compensar os filhos com excessiva permissividade. Passámos de um extremo ao outro.

O autoritarismo expressa-se por regras estanques e invioláveis, independentemente das circunstâncias e, muitas das vezes, por uma ausência de diálogo no sentido de adaptar as normas exigidas às diversas situações. Como consequência, temos uma relação pais/filhos distante, assente numa base emocional pouco sólida e com uma estrutura de relacionamento frágil. Já a permissividade revela-se numa ausência (quase) total de toda e qualquer regra, toda e qualquer repreensão, aceitação de todos os desejos expressos pela criança /adolescente, sem objecções. Esta atitude de facilitismo por parte dos pais promove uma insegurança e instabilidade crescentes – a criança desconhece quem a dirige, a acompanha, a apoia e suporta nas suas crises, criando um sentimento de pseudo abandono. A boa intenção parental, neste caso, é mais prejudicial do que benéfica - a criança experiencia uma desorganização interna, em termos emocionais, e manifesta essa desorganização, nomeadamente, através das chamadas “birras” frequentes. Por norma, este comportamento é revelador desse mal-estar interno.

Existirá, então, um modelo ideal para educar um ser em desenvolvimento? Não se pode dizer que exista uma regra de ouro, mas procurar equilibrar as atitudes parentais entre um excesso – autoritarismo – e o outro – facilitismo – será um bom passo para um desenvolvimento mais harmonioso. O ideal é, portanto, evitar os extremos, tão frequentemente incorrectos. Procuremos optar pelo meio-termo entre um autoritarismo impróprio (ausência de diálogo, regras incontornáveis e imutáveis) e a permissividade excessiva (de um grau de disciplina nível zero e de uma satisfação permanente de todos os desejos expressos pela criança).

A disciplina na educação é importante na medida em que define, durante o desenvolvimento infantil e juvenil, os limites por que nos orientamos. Promove o equilíbrio emocional, uma vez que delimita o nosso comportamento, dirige as nossas atitudes e permite-nos desenvolver a capacidade de aceitar as frustrações do dia-a-dia e saber lidar com elas – gerindo-as e ultrapassando-as, vivendo harmoniosamente em sociedade. Estas mesmas regras e limites permitem à criança ser correspondida nas expectativas, ou seja, se conheço os meus limites sei o que esperar de determinada atitude ou exigência. Isto é fundamental para uma criança ser correspondida nas suas expectativas; saber o que pode esperar; com o que pode contar. Para tal é preciso que a criação e transmissão desta disciplina seja implementada com consistência e coerência – os pais não podem proibir agora o que permitem daqui a pouco, por exemplo. Sendo ainda que a recusa de um desejo deve sempre ser acompanhada de uma justificação, ao invés do inapropriado “não, porque não!”.

Apesar de não existir a já referida e tão almejada regra de outro que possa aplicar-se a todas as crianças e adolescentes de forma a garantir a educação ideal, deixamos aqui algumas dicas mais generalistas para que possam servir de reflexão, tanto no registo da transmissão das regras, como no da atenção que deve ser dispensada à criança.

Dicas para disciplinar:
·       *  Procure não dar uma ordem se não estiver convicto de que é, realmente, para cumprir; por exemplo: pais que aumentam o tom de voz para exigir a arrumação do quarto, mas que, enquanto ralham, vão arrumando o quarto em simultâneo. A criança, aos poucos, desvaloriza o tom de voz e a exigência, porque percebe que não tem que cumprir nenhum objectivo, vai continuar a desarrumar o quarto e só precisa de estar preparada para ouvir o/a pai/mãe a falar alto por uns minutos. Em contraposição, tente transmitir a regra com um tom firme, directa e sem reticências. Não precisa aumentar o tom de voz, basta demonstrar que pretende realmente a arrumação – levada a cabo pelo(a) seu (sua) filho(a) – em tom sério, claro, preciso e sem que fique a ideia que se trata de um pedido porque, de facto, não o é. Certifique-se ainda de que o(a) seu (sua) filho(a) está a prestar atenção ao que lhe transmite sem interferências distrativas (jogos, amigos, etc).

·   *  O cumprimento das regras deve sempre gerar o reforço positivo. Também aqui deve ser claro e directo, por exemplo “gosto quando arrumas o quarto” ou “é muito bom quando fazes o que te digo”. Ao reforçar positivamente a conduta do seu filho, sempre que merecido, quer por palavras, quer por gestos de carinho, está a demonstrar-lhe que valoriza o seu comportamento e que está atenta a este, instigando a perpetuação de uma boa conduta

Revele interesse e atenção:
·     *   Preste atenção ao que o seu filho lhe quer contar ao fim do dia, revelando-lhe que se interessa pelas suas histórias. Exemplo: “Fico muito contente que partilhes isso comigo” ou “é bom saber o que acontece contigo quando estás com os teus amigos”. Adicionalmente, tente colocar-lhe questões sobre o que lhe está a contar, demonstrando que está realmente a ouvi-lo e interessado”. Por exemplo: “quer dizer, então, que te pareceu melhor fazer… “ ou “sim, sim estou a perceber o que me queres dizer. Fizeste isto ou aquilo porque…”

·      *   Pergunte-lhe se tem alguma coisa que queira contar-lhe, mas sem que a criança se sinta invadida pela curiosidade, ou seja, saiba aceitar caso não tenha nada para contar: “queres contar-me alguma coisa sobre o teu dia?” ou “parece que não te apetece falar, eu entendo, quero só que saibas que me interesso pelo que fazes e gosto que o partilhes comigo”. Deixe explícita a sua disposição e disponibilidade para a ouvir atentamente, sempre que exista essa necessidade. No entanto, a sua manifestação de aceitar o silêncio pode também ser preciosa. Apesar de(a) seu (sua) filho(a), a criança tem direito à sua privacidade e a optar pelo momento em que está disposta a partilhá-la consigo.


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QI versus QE

Vivemos numa sociedade que muito tem evoluído em termos de taxa de alfabetização. Nos últimos 40 anos, em Portugal, a curva destes gráficos é significativamente muito positiva.

Por força de circunstâncias várias, tornámo-nos mais atentos ao desenvolvimento cognitivo e, desde muito pequenos, os miúdos são muito estimulados para o conhecimento e a aprendizagem e recebem de pais e professores a expectativa avantajada de que o caminho é esse e “não deves falhar”.

O tempo de brincadeira fica encurralado nos intervalos do conhecimento e das atividades extra-curriculares. Que é como quem diz que não há tempo para brincadeiras livres. Aquelas em que não há o adulto a dirigir o momento, em que as regras e o cumprimento delas, cabe apenas aos miúdos. Aqueles momentos em que eles trocam experiências e aprendem com isso e que, dessa forma, ficam a conhecer-se melhor; que têm oportunidade de realmente empatizar uns com os outros. Agora, não há tempo! Agora, terminam a pré-primária a saber ler…

Os adultos, os cuidadores, tendem a ficar muito orgulhosos de verem os filhos crescer e já tão dotados de tanto conhecimento; já com tão boas notas que recebem como resultado dos testes de avaliação que fazem na escola. E estes factos ganham uma dimensão tão grande que não tem termo de comparação com a dimensão social. Parecem sobrevalorizar o aspeto escolar (cognitivo) e secundarizar o aspeto social/individual (emocional). Está bem inserido no grupo? Como funciona a relação com os pares? A integração parece adequada, mas conhece os limites e as regras do seu comportamento em relação ao outro – da sua idade e do adulto? Como gere as suas frustrações? Descarrega-as nos amigos ou consegue uma forma mais elaborada (tendo em conta a idade)? É sensível ao amigo ou passa-lhe por cima sem perceber o impacto que isso pode ter nele?

Negligenciar a importância de que as crianças se confrontem consigo e com os outros, para reconhecerem sentimentos, receios, motivações e intenções – suas e dos demais -, é progredir num caminho que nos conduz à insensibilidade, à indiferença e até ao desprezo pelos outros. É ir a trote de uma sociedade que apesar de mais instruída, mais culta e bem falante, os elementos que a compõem (pessoas) parecem ir perdendo o conhecimento básico de relacionar-se com os seus iguais.

É importante perceber se os filhos que vemos crescer conseguem desenvolver tão bem o famoso QI (quociente de inteligência), mas sem descurar a importância do QE (quociente emocional). Afinal de contas, de que nos serve um cérebro pejado de conhecimento, se não tiver a capacidade de reconhecer os seus sentimentos e os dos outros; se não souber interagir em grupo? A escolarização incute erradamente a ideia de que saber pensar é saber gramática, é saber fazer contas, resolver problemas e por aí adiante. Tem o cunho de que saber pensar e fazer tudo isto bem feito é ser inteligente. Mas, na realidade, as boas notas na escola não definem a capacidade, ou não, de pensar de uma criança. Saber pensar vai para além da linguagem escrita que a escola ensina. Ainda que seja inteiramente útil e necessária (matéria indiscutível!), não pode encerrar por si só o capítulo do conhecimento. Não pode anular a importância do falar, dialogar e do brincar.

Os parágrafos que se seguem são exemplos de meninos que mostram aos adultos como se pensa. Como têm a capacidade de PENSAR…

O M. de 7 anos, relativamente à importância que sentia dada à nota “Muito bom” (que ele próprio também tem) perguntou à mãe se “Satisfaz” é um mau resultado. Quando a mãe disse que também é uma boa nota, ele respondeu que “os amigos que têm “Satisfaz” depois chegam ao recreio e sabem brincar, mas os que têm “Muito Bom”, não sabem”.

O G., de 7 anos, sobre um amigo que chora na sala de aula, sempre que se sente questionado pela professora, dizendo não saber a matéria: “ Ele lá dentro dele, ele sabe. Por fora, é que ele pensa que não sabe”.

Menino a quem perguntaram o que é um segredo “Um segredo é uma coisa que os adultos dizem ao ouvido uns dos outros até toda a gente saber” in Santos, João dos (1988), “Se não sabe por que é que pergunta? conversas com João Sousa Monteiro”, Assírio & Alvim

Alexandra Silva Nunes
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